BAUDELAIRE - PAISAGEM
Fui traduzir Paysage para meu livro de teoria da mídia, e deu nisso:
Desejo, para compor castamente minhas églogas,
Deitar-me bem perto do céu, como os astrólogos.
Devaneando escutar, dos sinos, o lamento;
Seus hinos solenes levados pelo vento.
Com o queixo nas mãos, verei da gelosia,
Da fábrica que canta, a algaravia ;
Chaminés e campanários, mastros da cidade,
E o céu aberto, recordando a eternidade.
É doce ver nascer, na luz que se esfarela,
A estrela solitária: a luz numa janela ;
Os rios de carbono rumando ao firmamento,
E a lua derramando o claro encantamento.
Verei a primavera, o verão e o estio ;
E quando a neve branca estiver por um fio,
Deixarei persianas e portas bem fechadas
Para erigir na noite castelos de fadas.
Então reverei horizontes cheios de astros,
Jardins e repuxos chorando em alabastros,
Beijinhos e passarinhos de encantos mil,
E tudo o que o idílio tem de mais infantil.
A Revolta, em vão chegando até a soleira,
Não me fará levantar da minha cadeira ;
Pois estarei absorto no divertimento,
De lembrar da Primavera com o pensamento,
De tirar um sol do coração, e da mera
Tarefa de fazer da Idéia uma atmosfera.
(Trad. Adalberto Müller)
1 Comments:
Beleza de tradução -- esse deve ser um dos momentos mais singelamente líricos do nosso agônico Charles "albatroz" Baudelaire...
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